Literato Católico: Vittoria Colonna e a Poesia Católica
Vittoria Colonna, Marquesa de Pescara, foi uma das figuras literárias mais influentes do Renascimento italiano. Nascida em 1490 em Marino, foi filha de Fabrizio Colonna e Agnese de Montefeltro, crescendo em um ambiente aristocrático e intelectualmente estimulante. Casou-se jovem com Fernando de Ávalos, Marquês de Pescara, cuja morte na Batalha de Pavia marcou profundamente sua trajetória.
Reconhecida por sua poesia refinada e por seu papel de destaque na tradição petrarquiana, Colonna não se limitou ao mundo das letras. Foi uma mediadora política e uma reformadora religiosa, atuando com firmeza e originalidade em um tempo de grandes transformações. Sua obra poética, admirada por contemporâneos e por estudiosos posteriores, reflete uma intensa busca espiritual e um talento literário excepcional.
Obras
Rime spirituali – Uma coleção de poemas religiosos que refletem sua profunda espiritualidade e influência reformista.
Rime amorose – Poemas dedicados ao seu falecido marido, Fernando de Ávalos, seguindo a tradição petrarquiana.
Correspondência com Michelangelo – Cartas e poemas trocados entre os dois, revelando uma amizade intelectual e espiritual intensa.
Entre suas amizades mais célebres, destaca-se sua ligação com Michelangelo, que lhe dedicou poesias e desenhos. A relação entre os dois se aprofundou a partir de 1542, unida por discussões sobre arte e religião. Seus poemas dirigidos ao artista revelam não apenas um respeito mútuo, mas uma troca intelectual profundamente marcada pela espiritualidade e pelo questionamento interior.
Curiosidades
Amizade com Michelangelo – O artista dedicou-lhe vários poemas e desenhos, e esteve ao seu lado em seus últimos momentos de vida.
Influência na Reforma Católica – Colonna foi próxima de pensadores reformistas como Juan de Valdés e teve suas obras analisadas pela Inquisição. A Reforma Católica, também chamada de Reforma no interior da Igreja, refere-se aos esforços de renovação espiritual e institucional dentro do próprio catolicismo. Ela já estava em curso antes da eclosão da Reforma Protestante de Lutero em 1517 e envolvia figuras que buscavam uma fé mais autêntica e uma moral mais rigorosa, como o movimento devocional do século XV e os humanistas cristãos. Foi um resultado da Devotio Moderna do século XV analisada na aula Alienação e Intolerância ministrada em 26 de julho de 2022 (acesso aberto - Acervo Midiateca Salus aqui).
Casamento arranjado – Seu casamento com Fernando de Ávalos foi arranjado desde a infância, mas se tornou uma relação de grande afeto.
Primeira mulher a publicar poesia na Itália – Foi uma das primeiras mulheres a ter suas obras impressas e amplamente divulgadas no século XVI.
Vittoria Colonna faleceu em 1547 no convento de Santa Ana (embora não tivesse feito votos formais), onde passou seus últimos anos. Sua vida e obra continuam a ser objeto de estudos e interpretações, reafirmando seu papel como uma das mulheres mais notáveis do século XVI. Seu legado poético e sua presença ativa nos debates políticos e religiosos da época fazem dela uma figura essencial para a compreensão do Renascimento italiano.
Amostra para Apreciação
Se um pequeno punhado de terra guarda (tradução nossa)
Se um pequeno punhado de terra guarda,
por graça de Deus, a alma eterna e imensa,
não encontra igual ao seu desejo
nem repousa em guerra tão incessante.
Do abrigo fiel fecha-se por dentro,
sobe e desce em mesma medida;
e entre vãos degraus, ilusões enganosas,
pelo labirinto humano vaga e delira.
Não vê o fim do fio que a vida tece,
mas urde e planeja, segura e solta,
afrouxa e puxa de sua trama frágil.
E ao desejo apenas redime
e liberta da névoa mortal que o enfraquece,
a fé nas coisas altas e divinas.
Crítica de Cultura – Professora Ana Paula Barros
A amizade, vista pela tradição católica como um dom de Deus, é uma semente que encontra um terreno árido na percepção moderna dos sexos. A amizade entre homens e mulheres parece carregar o sinal da corrupção e da inevitável distorção moral. Isso se deve à perda da pureza – um coração e uma mente impuros estabelecem a impureza como norma. Neste cenário, é realmente inesperado encontrar histórias de amizades tranquilas em épocas consideradas antigas.
O enriquecimento seguro é possível quando há complementariedade, mas, para isso, seria necessário um coração mais puro. O que soa como uma esperança frágil em um mundo tomado pelo ciúme, pela inveja e por relacionamentos quase sempre fundamentados em interesses físicos, seja sexuais ou financeiros.
Michelangelo era 15 anos mais velho que Vittoria. Eles iniciaram sua amizade já em idade avançada, e sua relação se aprofundou por volta de 1542, quando ele tinha 67 anos e ela, 52. Talvez a idade realmente traga sabedoria.
Amizades que transcendem o interesse físico e sexual, como as de Michelangelo e Vittoria, Santa Teresa e São João da Cruz, São Francisco e Santa Clara, talvez tenham adquirido um tom mitológico devido às limitações impostas pela segregação dos sexos, reforçada por frases como “homens se formam com homens e mulheres com mulheres”. Grupos assim segregados tendem a reforçar suas próprias fraquezas e limitações, tornando-se incentivos para o confinamento mútuo. Por outro lado, uma dinâmica complementar permite a influência do olhar do outro, do pensamento do outro – e certamente favorece o fortalecimento, não a fragilidade.
Entretanto, essa relação complementar foi reduzida ao erótico, tornando-se comum encontrar mulheres que não conseguem conversar sobre temas relevantes entre homens, e homens que não sabem conduzir conversas interessantes com mulheres — a menos que haja um interesse sexual, romântico ou financeiro envolvido.
Mas nós, segundo alguns, evoluímos.
Ana Paula Barros
Especialista em Educação Clássica e Neuro Educação pela Pontifícia Universidade Católica. Graduada em Curadoria de Arte e Produção Cultural pela Academia de Belas Artes de São Paulo. Professora independente no Portal Educa-te (desde 2018). Editora-chefe da Revista Salutaris e autora dos livros: Modéstia (2018), Graça & Beleza (2025).
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